Há alguns anos, os santinhos distribuídos nas missas de sétimo dia eram a última lembrança a ser guardada de um amigo ou ente querido que se foi. Agora, tributos criados na internet em homenagem a pessoas que morreram já se tornaram comuns e parecem dar sobrevida a quem já não está mais entre nós: são comunidades ou perfis nas redes sociais, blogs e até sites que incluem apresentações de slides, vídeos, músicas, narrativas e um cronograma da vida do homenageado.
Alguns portais no exterior já oferecem serviços profissionais para tornar mais fácil para os enlutados criarem a presença online de um parente falecido. E a interação não para por aí: uma empresa americana começou a vender um serviço que permite que qualquer pessoa em vida possa construir o seu próprio memorial virtual. O I-Memorial.com (https://www.i-memorial.com/) promete oferecer uma página ao cliente que se divide em três espaços: “Meu Memorial” (onde as pessoas podem deixar mensagens), “Minhas Mensagens” (no qual o usuário pode deixar gravações para amigos e familiares, que só terão acesso ao conteúdo se forem selecionados pelo cliente e souberem responder a questões de segurança) e “Meus Últimos Desejos” (onde o usuário dá instruções sobre como quer que seja realizado seu funeral, além de poder colocar dados sobre seguros, investimentos, senhas, etc). Depois da morte, um administrador determinado pode assumir o controle do site, pagando uma taxa anual. Ele será uma espécie de curador do falecido, aprovando novos depoimentos.
Por causa do risco de vazamento de dados, um código de comportamento ético – que abrange administração, direitos e responsabilidades – foi acordado por representantes de sites de memorial respeitáveis na internet. Até mesmo as redes sociais estão se adequando ao assunto. Em 2009, o Facebook decidiu não apagar os perfis de usuários que morreram. Mas, para proteger a privacidade do falecido, só os amigos podem ver o perfil ou localizá-lo em uma busca. O site também remove qualquer informação de contato e impede que as pessoas façam login na conta.
Para manter viva a união da família após a morte da avó, o empresário André Rodrigues, de 40 anos, criou uma comunidade e um perfil no Orkut para ela. Segundo ele, a ideia foi manter um álbum de família coletivo, restrito a familiares, que vivem em cidades diferentes e poderiam usar o espaço para se comunicar e relembrar os momentos vividos com a matriarca: “No início, muitos adicionaram o perfil. Mas, poucos enviaram fotos. Pensei que daria mais resultado, mas as pessoas não assimilaram a ideia”.
Iniciativas como a de André podem ser uma boa maneira de lidar com o luto, mas não são bem vistas por todos. A estudante Amanda Lisboa, de 25 anos, não gostou quando a irmã mudou o perfil dela no Orkut e colocou uma foto com a avó, que havia acabado de morrer:
“Ao mudar a foto do perfil, minha irmã nos obrigava a ficar vendo o retrato com a minha avó a cada atualização. Para ela, podia ser uma maneira de superar o luto. Mas, para mim, não. Ficar vendo o rosto de minha avó toda hora e saber que eu não poderia mais falar com ela ou abraçá-la era algo que me incomodava”.
“Ao mudar a foto do perfil, minha irmã nos obrigava a ficar vendo o retrato com a minha avó a cada atualização. Para ela, podia ser uma maneira de superar o luto. Mas, para mim, não. Ficar vendo o rosto de minha avó toda hora e saber que eu não poderia mais falar com ela ou abraçá-la era algo que me incomodava”.
Segundo a doutora Vera Lucia Soares Chvatal, pesquisadora do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, a atitude de criar ou manter um perfil na internet de alguém que morreu tanto pode ajudar a pessoa a elaborar um luto normal quanto pode prolongar o sofrimento indefinidamente:
“Depende de cada caso. O luto é considerado normal quando se estende por um período de cerca de dois anos. Após esse tempo, obviamente aproximado, se a pessoa não conseguiu se desligar do ente perdido e dar prosseguimento a sua vida normal, passa a ser considerado luto patológico. Nesse caso, ela vai precisar de ajuda especializada”.
“Depende de cada caso. O luto é considerado normal quando se estende por um período de cerca de dois anos. Após esse tempo, obviamente aproximado, se a pessoa não conseguiu se desligar do ente perdido e dar prosseguimento a sua vida normal, passa a ser considerado luto patológico. Nesse caso, ela vai precisar de ajuda especializada”.